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sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Ética a Nicômaco. Liv II, cap 4 - 9: Disposição

Cap. IV – Disposição

Disposição: condição necessária à prática das virtudes [1]

A Ação: segundo Aristóteles, “devemos tornar-nos justos praticando atos justos, e temperantes praticando atos temperantes” (1105a18)[2]. Mas é preciso determinada condição ao praticá-los:

1. Conhecimento: “deve ter conhecimento do que faz”;

2. Escolha certa: “deve escolher os atos, e escolhê-los por eles mesmos”;

3. Firmeza: “sua ação deve proceder de um caráter firme e imutável” (1105a30).

Sendo as duas últimas condições, Escolha certa e Firmeza, resultado da prática repetida e esmiuçada, mais importante que o Conhecimento. Ou seja, “é acertado dizer que pela prática de atos justos se gera o homem justo, e pela prática de atos temperantes, o homem temperante” (1105b7), e não basta conhecer, deve agir.

Cap. V – As disposições envolvem escolhas

Na alma, encontramos “três espécies de coisas: paixões, faculdades e disposições de caráter; a virtude deve pertencer a uma destas” (1105b20).

1. Paixões: do natural, do desiderativo, do apetitivo, acompanhados de prazer e dor; do universal.

2. Faculdades: da percepção relativa, da simples capacidade de sentir as paixões; do singular.

3. Disposição de caráter: ação na escolha entre um de dois contrários. É a posição que tomamos com referência às paixões: “má se a sentimos de modo violento ou demasiado fraco; e boa se a sentimos moderadamente” (1105b25).

Portanto, as virtudes não sendo paixões nem faculdades, “só resta uma alternativa: a de que sejam disposições de caráter” (1106a10).

Cap. VI – Virtude, uma disposição de caráter e escolhas

Virtude: qualquer ação bem realizada com a excelência que lhe é própria. Diz respeito às paixões e ações, as quais existem excessos, carência e meio termo. Segundo Aristóteles, “disposição de caráter que torna o homem bom e o faz desempenhar bem a sua função” (1106a24).

Excelência: “Toda virtude ou excelência não só coloca em boa condição a coisa de que é a excelência como também faz com que a função dessa coisa seja bem desempenhada” (1106a16). Por exemplo, é graças a excelência do olho que vemos bem.

O meio termo e o igual: Em tudo que é continuo e divisível pode-se tomar mais, menos ou uma quantidade igual, e isso quer em termos da própria coisa, quer relativamente a nós; e o igual é o meio termo entre o excesso e a falta (1106a26).

Extremo absoluto: o meio termo da própria coisa (a substância): o equidistante entre dois extremos; do absoluto, “é um só e o mesmo para todos os homens (1106a30).

Extremo relativo: o meio termo relativamente a nós (o sujeito): nem muito, nem pouco, este não é um só e o mesmo para todos os homens.

Quididade (essência necessária 'substancial' ou substância): aquilo que, sem tirar nem por permanece igual, preserva a sua excelência. É parte da natureza específica da virtude buscar (no extremo absoluto) e escolher (no extremo relativo), o meio termo não só no objeto, mas [também] relativamente a nós (1106b5).

O meio termo e a excelência: é atributo da virtude visar o meio termo. Prazer e dor devem ser sentidos na ocasião apropriada, com referência aos objetos apropriados, para com as pessoas apropriadas, pelo motivo e da maneira conveniente, nisso consistem o meio termo e a excelência característicos da virtude (1106b20).

Segundo os pitagóricos: “o mal pertence à classe do ilimitado e o bem à do limitado”. Para Aristóteles, só há um modo de acertar: “fácil errar a mira, difícil atingir o alvo. Pelas mesmas razões o excesso e a falta são características do vício, e a mediania da virtude” (1106b30).

Mediania e Extremo: A virtude é, pois, uma disposição de caráter relacionada com a escolha e consiste numa mediania, isto é, a mediana relativa a nós, a qual é determinada por um princípio racional próprio do homem dotado de sabedoria prática. E é um meio termo entre dois vícios, um por excesso e outro por falta (1107a); mas com referência ao sumo bem e ao mais justo, é, porém, um extremo (1107a8).

Conclusão: A virtude moral ou boa medida de nossas emoções é concebida entre o prazer e a dor (virtudes morais II); mas é também resultado de nossa disposição de escolher por deliberação, segundo a razão (virtudes intelectuais). Seu perfeito equilíbrio consiste em estabelecer uma mediedade relativa entre esses dois pontos; e cabe a nós a escolha priorizando a reta razão num jogo entre esses dois contrários: Emoção X Razão.


Cap. VII – Algumas escolhas

Difícil atingir o alvo (1106b30). Difícil acertar o meio-termo, a virtude entre dois vícios: excesso e falta.

Coragem: meio-termo entre os sentimentos de medo e de confiança. Os que excedem na audácia tornam-se temerários; e os que excedem no medo, covardes;

Temperança: entre prazeres e dores. O excesso, intemperança; a falta, insensibilidade;

Liberalidade (generosidade): o excesso torna o sujeito pródigo; a falta, avarento. E neste caso, são deficientes e excedem de maneira opostas: o primeiro excede no gastar e é deficiente no receber; o segundo excede no receber e é deficiente no gastar;

Magnificência (este se refere à grandes volumes): o excesso, a vulgaridade e mau gosto; a falta, mesquinhez;

Honra: o excesso, vaidade, ambição; a falta, humildade indébita, desambição;

Cólera moderada ou calma: o excesso, irascibilidade; a falta, pacatez;

Três termos com relação às palavras no discurso, onde também o meio termo é louvável e os extremos nem louváveis nem corretos, mas dignos de censura:

Veracidade o excesso, jactância, arrogância, fanfarrice; a falta, falsa modéstia;

Espirituoso: o excesso, a chocarrice, o jocoso, a insolência; a falta, o rústico;

Amabilidade: o excesso torna o sujeito obsequioso quando não há nenhum propósito determinado, e lisonjeiro se visa o interesse próprio; a falta, mal-humorado, rixento.

Meios-termos nas paixões:

Modesto: o excesso, acanhado, pois se envergonha de tudo; a falta, o despudorado;

Indignação: o excesso, a inveja (aflige-se com toda boa fortuna alheia); a falta, o despeito, a decepção.

Cap. VIII – Três disposições

São três as disposições, duas delas são vícios (excesso e falta), e a terceira uma virtude, o meio-termo.

E “cada uma delas se opõe às outras duas, pois cada disposição extrema é contrária tanto ao meio-termo como ao outro extremo, e o meio termo é contrário a ambos os extremos” (1108b10).

Maior contrariedade: “A maior contrariedade é a que se observa entre os extremos, e não destes para com o meio termo” (1108b26). Ou seja, há uma maior proximidade entre o meio-termo e um dos extremos (os dois que mais se assemelham), “como a temeridade com a coragem e a prodigalidade com a liberalidade” (1108b31); o contrário, uma maior deficiência (mais dessemelhantes), a exemplo da covardia que mais se opõe à coragem.

Substãncia X Sujeito: parte da disposição é causas inerente, por natureza, à própria coisa. “A outra reside em nós mesmos, pois aquilo para que mais tendemos por natureza nos parece mais contrário ao meio-termo. Por exemplo, nós próprios tendemos mais naturalmente para os prazeres, e por isso somos mais facilmente levados à intemperança do que a contenção” (1109a10).

“Mais contrários ao meio-termo aqueles extremos a que nos deixamos arrastar com mais frequência” (1109a16).


Cap. IX – A virtude moral é um meio-termo

A virtude moral é um meio-termo: E “meio-termo entre dois vícios, um dos quais envolve excesso e o outro deficiência, e isso porque a sua natureza é visar à mediania nas paixões e nos atos” (1109a20).

Veja que não é fácil ser bom e virtuoso. Difícil acertar o que convém, com precisão, “na medida, na ocasião, pelo motivo e da melhor maneira que convém” (1109a27). Por isso a virtude é tão louvável, pois ela se encontra numa mediania entre dois vícios, dois extremos, sendo que um é sempre mais vicioso do que o outro. Relembrando o exemplo virtuoso da coragem, temos o vício da covardia como mais extremo e errôneo do que o vício da temeridade, esse, mais afinado com a coragem. E “Quem visa ao meio-termo deve primeiro afastar-se do que lhe é mais contrário” (1109a30), do erro, esforçando-se em seguir na direção oposta. Alerta ainda o filósofo para que tenhamos uma especial atenção para com as coisas do prazer, “pois não podemos julgá-la com imparcialidade” (1109b9), e tendemos a exceder.

Conclusão: “Em todas as coisas o meio-termo é digno de ser louvado, mas que às vezes devemos inclinar-nos para o excesso e outras vezes para a deficiência. Efetivamente, essa é a maneira mais fácil de atingir o meio-termo e o que é certo” (1109a25).



[1] ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco, Livro II, cap. 4-9;
[2] ARISTÓTELES (348-322 a.C). Metafísica : livro 1 e livro 2 ; Ética a Nicômaco ; Poética ; seleção de textos de José Américo Motta Pesanha ; trad. Vincenzo Cocco; -- São Paulo : Abril Cultural, 1979. (Os pensadores); e ZINGANO, Marco. Aristóteles : tratado da virtude moral ; Ethica Nicomachea I 13 - III 8, Obras comentadas. -- São Paulo : Odysseus Editora, 2008;

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Texto Completo: ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco.
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